fbpx
Recrutamento operacional

Recrutamento Operacional: supedâneo informacional da Atividade de Inteligência

  • 2 julho, 2021

Dentre as tipologias das “ações de busca”, acredita-se que o recrutamento operacional do colaborador ou do informante seja a mais notável atividade de obtenção de informações privilegiadas com potencial de auxiliar o processo decisório.

Portanto, a compreensão doutrinária da sua dinâmica e das suas características, torna-se essencial ao pleno conhecimento do manejo de tal ferramenta.

Conceituando o recrutamento operacional

Como ponto de partida buscaremos guarida na Doutrina Nacional de Inteligência de Segurança Pública (DNISP) que conceitua o recrutamento operacional como sendo uma “ação de busca realizada para convencer uma pessoa não pertencente à atividade de inteligência a trabalhar em benefício desta”.

Para que o recrutamento operacional tenha êxito é recomendável que seja observado algumas etapas em sua operacionalização como: assinalação, investigação, seleção, aproximação, abordagem, treinamento, utilização e dispensa. Além disso, o seu êxito dependerá da qualidade do planejado, o qual deverá considerar a motivação do recrutado, a habilidade do recrutador e a possibilidade de imprevistos.

Convém destacar que nem sempre o recrutado tem a necessidade de saber que está, em certo sentido, trabalhando para uma agência de inteligência. Tudo dependerá da situação e da qualidade da informação que está sob o guarda-chuva do elemento de operações (ELO).

Diante dessa premissa surge o primeiro dilema: Como ter informação sem se aprofundar com a fonte a ponto de se comprometer judicialmente?

Primeiramente deve-se ter em mente que o ser humano tem a necessidade de se comunicar. O psicólogo norte-americano Abraham Maslow propôs que as pessoas são movidas por necessidades universais ao longo da vida. Segundo ele, não importa se somos esquimós, gregos ou baianos. Diariamente precisamos de alimentos que abasteçam os nossos organismos, de um abrigo que nos proteja dos perigos do mundo, do carinho e afeto das pessoas ao redor, dos cuidados com a autoestima e autorrealização.

 

Pirâmide de Maslow

 

Maslow, a meu ver, poderia ter proposto, em seu festejado modelo, mais uma motivação humana: a necessidade de nos comunicar.

Tal necessidade pode ser abstraída da psicologia humana. E com base nessa constatação científica que o agente de operações logrará êxito no recrutamento operacional. Tudo começa com uma bem urdida entrevista encoberta, onde poderá detectar qual o nível de profundidade que este colaborador ou informante tem sobre o assunto de interesse da Agência de Inteligência. Deve-se atentar ao interesse desse colaborador/informante em repassar ou colaborar por meio das informações. Um ponto importante nesse procedimento é o exato respeito ao tempo de confiança entre o recrutado e o agente. Somente após o estabelecimento desse rapport (relação mutua de afinidade) ele sentirá seguro em repassar informações com qualidade.

Sobre a questão do informante, é necessário saber qual posição hierárquica que ele ocupa na organização criminosa. Mas para desvendar isso é necessário um treinamento eficaz e contínuo.

Para utilizar as fontes humanas, é necessário que o órgão de Inteligência possua um amplo programa de capacitação de seus agentes, que envolva técnica e tática em operações” (FARAH, 2015, p. 40).

Independentemente do tipo de fonte recrutada, cabe ao ELO observar cada cenário de forma singular, avaliando quais dos elementos humanos disponíveis podem ser úteis na obtenção de dados e informações relevantes. E, a partir de então, iniciar um trabalho de extração de dados e informações, seja com observações de comportamento, entrevistas e outras técnicas de engenharia social. Essa engenharia social pode ser superficial ou ainda, utilizar-se de técnicas mais complexas como recrutamentos sistemáticos utilizando de infiltrações telemáticas sociais, o que pode, inclusive, provocar desinformação ao alvo que seja de interesse da agência.

Sobre o aspecto de recompensa no recrutamento, um dos bens que podem ser explorados pelo AI é a proteção da vida do recrutado e de seus familiares. Nesta linha de pensamento, criar situações favoráveis para o seu recrutamento faz parte de desta ação de busca.

Vamos supor que um determinado membro de facção criminosa começa ser ameaçado pelos próprios integrantes sendo necessário que ele tenha que saldar uma dívida em prol da preservação da sua vida. Então, surge a seguinte pergunta: Qual o aspecto motivacional? A reposta é clara e objetiva: A preservação da vida! Isso deve ser bem explorado pelo ELO a fim de se obter informações que levará a compreender toda sistemática (rotas, modus operandi, formas de recrutamento, etc.) de uma facção criminosa em expansão no país.

Em outra situação, em que o informante está preso (em presídios de celas separadas por facção ou liderança), pode-se utilizar como recrutados familiares e amigos do indivíduo que o visitam semanalmente. Informações trazidas por eles pode ser relevante para setores da inteligência em possíveis articulações de fuga ou rebelião, que também é de interesse de ação tática de inteligência e da segurança da sociedade.

Em invasões de propriedades rurais, os próprios funcionários destas fazendas podem contribuir muito para o assessoramento em relação a movimentos sociais de grileiros e posseiros, além de informações de pouso e decolagens de aviões monomotores utilizados para o narcotráfico, que voam em baixa altitude para não ser detectado pelos radares.

Diante daquilo que foi exposto, concluo que o colaborador/informante são os olhos da inteligência que podem estar em qualquer lugar e em qualquer hora. Basta que este recrutamento operacional seja feito de forma contígua e eficaz a fim de se manter uma bela e duradoura colaboração para os setores de inteligência, para o enfrentamento qualitativo do fenômeno da violência e da criminalidade.

Por Thelson Takeshi Iseki Kumagai, Cap. PMMS

Referências

Abraham H. Maslow. (1987). Motivation and personality (3rd ed.). New York.

Comente sobre este artigo